“Não há nada bom ou mau, mas pensar torna isso verdade.”
Hamlet, William Shakespear
Arte por: Jefferson Muncy Art_jeffersonmuncy.com
A conexão faz parte da realidade e do imaginário de todo o ser humano. As nossas emoções e sentimentos são a seiva, da nossa conexão connosco e com o mundo.No geral, tendemos a concordar que as emoções são importantes, para expressar quando estamos tristes ou contentes.No entanto, existem mais emoções e sentimentos que visitamos poucas vezes. Cada emoção tem um grau de intensidade do mais baixo ao mais elevado.
A nossa tendência é temer as emoções e sentimentos mais viscerais. O grau emocional que cada pessoa consegue gerir, varia. Quando a intensidade emocional torna-se insuportável, fazemos qualquer coisa, para evitar sentir as emoções que se manifestam ora peito, no estômago e por vezes, em todo o corpo. Guardamos no cérebro na tentativa de gerir as emoções com mais segurança. Recorremos ao álcool e outras dependências para não ter de sentir. E assim começamos o processo de desconexão.
Em algum momento da nossa vida, tomámos uma decisão sobre a nossa relação com as emoções, que pode ser resumida nesta ideia: “sentir as
emoções, com todo o nosso corpo, é um lugar doloroso para estar, por isso, é mais seguro desconectar.”
Desconectámos do nosso corpo como uma estratégia de proteção dos traumas emocionais. É um mecanismo de sobrevivência para lidar com o que não entendemos - como normas culturais, expectativas, abuso, pressões - e assim, lidamos com a dor, o medo e situações desagradáveis. Procuramos refúgio no online, na realidade virtual, na mente e na racionalização de toda a nossa experiência.
Esta hipotética separação entre mente e corpo, não faz jus à nossa essência e à nossa profunda necessidade de relacionar e sentir. Fomos desenhados para a conexão, para agirmos como membros de uma tribo. E, mesmo quando estamos sozinhos, a nossa essência é ser parte de um sistema maior de subsistemas aninhados.
De acordo com o neurocientista António Damásio: “É o organismo inteiro e não apenas o corpo ou o cérebro que interage com o ambiente… Quando vemos, ouvimos, tocamos, provamos, ou cheiramos; o corpo, propriamente dito, e o cérebro, participam na interação com o ambiente.”
Os três cérebros
Apesar da inevitabilidade da nossa interdependência, a nossa mente, quando colocada no topo da pirâmide das decisões, é prolífica em criar histórias de separação, desconexão e de domínio. Ajudou-me bastante procurar a relação entre as partes, utilizando não só a mente, mas também a intuição, a emoção e a consciência.
Foi importante descobrir que temos três cérebros, que estão em permanente relação de interdependência: na cabeça temos cerca de 86 biliões de neurónios, que cuidam da lógica e da razão, observam o mundo, os seus padrões e fazem planos futuros. No coração, temos 39 milhões de neurónios que se relacionam com o mundo através das emoções, memórias e visões. E, no intestino, temos cerca de 100 milhões de neurónios que se manifestam através da intuição, do instinto e da abordagem direta e pratica.
Percebi que quando escutamos e consideramos estes três cérebros, criamos uma sinergia poderosa e conexão profunda na nossa vida. E que a visão de separação que considera um só cérebro, ignorando o cérebro do coração, do intestino ou o nosso corpo como um todo, tem um impacto destrutivo no nosso comportamento, pensamento e emoções: agimos em interesse próprio, oprimimos os outros e o ambiente, criamos linhas de protecção, queremos controlar e encontrar culpados.
Muitos de nós, aprendeu na escola e em casa que o medo, a raiva e a dor são sentimentos a evitar, porque demonstram instabilidade e nos
desconectam da normalidade. Cedo, fomos influenciados pelos dizeres “um homem não chora”; “sentir é para fracos” ou que temos de “eliminar a competição”.
De forma consciente ou inconsciente estas ideias aproximam nos de uma sociedade patriarcal que cria fragmentação e que gera sofrimento, que está desconectada do seu propósito e da vida. Evitar sentir é negar quem somos connosco e com os outros. Não há poder na desconexão.
Arte por Molly Costello Arte and Design
O que nos conecta?
Verifico que o que nos conecta é a coragem de sentir, escutar o silêncio antes da fala, escutar a fala e o silêncio após a fala, chorar quando for preciso, honrar a sabedoria da dor, da raiva e do medo. Redescobrir a inteligência da vulnerabilidade, do não saber, a imaginação e o potencial incrível da colaboração. Habilidades que, por vezes, ativamos quando percebemos que existe um inimigo comum poderoso: como um vírus que coloca em causa a nossa sobrevivência.
E se em vez de focarmos na sobrevivência, focássemos da atualização e saúde do sistema do qual fazemos parte? Procure observar as suas ações, com atenção. Estão mais alinhadas com uma visão de mundo separada ou interconetada? O que seria diferente se a sua cultura e da sua organização refletissem, nas suas ações, a importância das relações, das emoções, da empatia e se inspirassem na conexão com todos os sistemas vivos?
Percebo que o processo de perguntar, auto-observar faz parte de uma liderança consciente que regenera os modelos mentais já obsoletos. Contribui para a mudança de percepção individual que transforma todo o sistema.
Quando estamos presentes e conscientes em relação ao que sentimos, conectamos com a universalidade do que é ser humano. Ao conectarmos com o nosso medo, raiva e dor abrimos espaço para a nossa autodescoberta onde habitam a alegria e o amor - o eterno regenerador.
São as transformações internas, a forma como pensamos e sentimos que contribuem para criar um mundo verdadeiramente sustentável. Ter consciência e notar o que influencia a nossa ideia de separação e a nossa desconexão, liberta-nos para a agir e regenerar a partir da nossa dimensão pessoal. Colocamos o nosso melhor potencial a serviço da nossa comunidade e do sistema maior onde estamos inseridos.
Por Virgílio Varela
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